quinta-feira, abril 20, 2006



A velha senhora pede socorro
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Billings padece e comemora seus 81 anos de existência da pior maneira possível
André Sato
Que a água tem tornado escassa no mundo de hoje e que, num futuro próximo, poderá ser a mais valiosa commodity (matéria-prima), não há dúvida! Considerando estas informações, o que se espera da população global, desde autoridades até cidadãos? O mínimo é que zelem por esse importante recurso. Porém, o que se nota é justamente o contrário. Um exemplo clássico e que está bem próximo do campo de visão, tanto dos munícipes, quanto dos governantes das cidades da maior região metropolitana brasileira, é a Represa Billings, que recentemente completou 81 anos de existência.

Conforme definido no Art. 2º da Lei Estadual 9866/97, entre os objetivos das normas estabelecidas especificamente para a Billings, estão: preservar e recuperar este importante manancial regional, de interesse metropolitano; compatibilizar as ações de preservação dos mananciais de abastecimento e as de proteção ao meio ambiente como o uso e ocupação do solo e o desenvolvimento socioeconômico; integrar os programas e políticas setoriais à preservação do meio ambiente.

De acordo com o Relatório de Impactos Ambientais Billings 2006 – elaborado por uma parceria entre as ONGs Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (PROAM) e Serviço Aéreo e Terrestre de Salvamento e Proteção Ecológica (SATS), nada disso vem sendo cumprido. A represa diminuiu cerca de 20 Km² e caso não sejam tomadas medidas imediatas, o abastecimento hídrico do Grande ABCD e de regiões paulistanas estará comprometido. Entre as causas desta constatação estão as ocupações irregulares, o assoreamento, a degradação de encostas e, possivelmente, o processo de revitalização do Rio Pinheiros por meio do processo de flotação e o trecho sul do Rodoanel.

No início da década de 20, em razão de uma crise no abastecimento de energia elétrica na Capital, a empresa canadense Light iniciou estudos sobre a construção de uma hidrelétrica que aproveitasse águas da bacia do planalto, lançando-as sobre um desnível, rumo à Serra do Mar para acionar turbinas de geração de energia elétrica. O local escolhido foi o Vale do Rio das Pedras, próximo à Vila de Paranapiacaba. As obras começaram em 1925. Após a execução da obra, águas de inúmeros rios situados em planalto foram conduzidas para formar uma represa. A princípio era chamada de represa do Rio Grande e, posteriormente, Billings. Por meio de canais e túneis, essas águas eram direcionadas a sete grandes cilindros que acionavam as turbinas da Usina de Cubatão (Henry Borden), em uma queda de 713 metros rumo ao nível do mar.

Na década de 30, o espelho d’água do reservatório, segundo a empresa de energia canadense, compreendia 127 km², atualmente, conforme dados atuais do Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado de São Paulo (DAEE) houve uma redução para pouco mais de 100 km². “O primeiro passo contra a degradação é proteger o que restam das áreas de mananciais, prioritariamente as áreas de cabeceira, onde ficam os campos naturais da Serra do Mar, onde há a produção de água do reservatório”, relatou Carlos Alberto Bocuhy, conselheiro do Conselho Estadual do Meio Ambiente (CONSEMA) e presidente da ONG PROAM.

Muitos trechos no entorno do reservatório já estão densamente habitados, chegando a beirar a linha d’água. As ocupações irregulares e invasões clandestinas são incontáveis, há toda uma infra-estrutura instalada ao redor da represa. “Se a Billings for considerada um manancial de água, o governo está atrasado no que diz respeito ao tratamento dos esgotos das áreas que circundam o reservatório”, frisou Hermínio Costa, presidente do SATS.

Provavelmente, caso não haja medidas de contenção, pode haver uma queda na qualidade de vida da população local, por exemplo, uma água de pior qualidade, que exige um tratamento mais caro, sem contar o racionamento. “O braço do Rio Grande, onde captamos a água para tratamento, é totalmente isolado da Billings por uma compartimentação, justamente por ser uma água para abastecimento e nós estamos com uma capacidade hídrica muito boa, o fato de ter havido uma diminuição no volume de água não compromete”, contestou Saullo Angelinno, gerente da Estação de Tratamento de Água Rio Grande, da SABESP.

Contudo, segundo o conselheiro do CONSEMA, cabe um esclarecimento com relação à divisão entre a Billings e o braço Rio Grande, citada por Angellino, da SABESP: “quando a Billings começou a receber grande quantidade de esgoto do Rio Tietê, por meio do Rio Pinheiros, foi feito barramento no braço Rio Grande, separando-o do corpo principal da represa. Mas, o braço do Rio Grande é o canal principal da Billings, só que é compartimentado, isto é, a produção deste braço é retirada para abastecer o Grande ABCD e, quando está cheio, a água vai para o corpo principal”.
Rodoanel

Que o projeto do Rodoanel tem uma proposta muito interessante e conveniente a todos os cidadãos paulistanos, isto é indiscutível. Quem não gostaria de transitar pelas Marginais com trânsito fluente? Desafogar o fluxo de veículos da cidade, sobretudo o denominado trânsito de passagem, ou seja ônibus, caminhões e veículos que rumam para outras regiões. Essa é a premissa básica do projeto. É um empreendimento de relevância nacional, pois facilitará o fluxo de cargas que seguem para países do Mercosul, Porto de Santos e também os deslocamentos de cargas entre o Norte e o Sul do País. Quando finalizado, a estrutura interligará dez importantes eixos rodoviários que conectam a Região Metropolitana com o interior e o litoral do Estado e capitais brasileiras.

O Rodoanel seria uma obra de viabilidade indiscutível, se não fossem alguns aspectos negativos da construção no tocante ao meio ambiente. “O primeiro impacto é a obra física em si: ela causa um impacto de construção, ela rasga os mananciais”, disse Bocuhy. O trecho sul da rodovia corta áreas de mananciais nas represas Billings e Guarapiranga, segundo documento aprovado pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (CONSEMA), estas áreas receberão 2,3 milhões de pessoas nos próximos anos, proporcionando uma ocupação totalmente desordenada. “Outro fator negativo é o Rodoanel, não como obra, mas como elemento de indução à ocupação do reservatório, não só a ocupação legal, como novos empreendimentos, galpões industriais, como a ilegal, que acaba vindo em conseqüência desse boom imobiliário”, frisou Bocuhy.

Já o presidente do SATS atentou para a questão do desmatamento e poluição na região. “Eles vão desmatar centenas de hectares de Mata Atlântica, vão colocar quilômetros de rodovia sobre a água. Será que eles conseguiriam evitar um acidente com veículos que transportem produtos químicos?”, questionou Costa.

A revitalização do Pinheiros

Com seus 23 quilômetros de extensão e o pouco escoamento de córregos e nascentes, o Rio Pinheiros possui uma vazão muito pequena (10 m³ por segundo). Somando a isso, o grande volume de esgoto lançado por residências faz com que uma enorme quantidade de detritos se acumule em todo seu curso. Entre as possibilidades de revitalização do Rio Pinheiros, uma já está sendo executada. Trata-se da despoluição do Rio Tietê, que conseqüentemente beneficia o Pinheiros.

A segunda, mais polêmica, diz respeito ao processo de flotação, que bombearia a água “despoluída” do Pinheiros para a Billings que, como já foi dito acima no texto, abastece boa parte do Grande ABCD e de bairros da zona Sul paulistana. O processo de tratamento da água por meio da flotação consiste na aplicação de substância químicas que aglutinam os poluentes. Após serem misturados a bolhas de oxigênio, esses flocos vão à superfície, onde equipamentos especiais fariam a drenagem do material flutuante.

Uma das motivações para a implantação do projeto é que uma maior quantidade de água enviada para a Billings ocasionaria um aumento na geração de energia na Usina Henry Borden, em Cubatão. “Com esse sistema de tratamento, nós passaríamos a bombear um maior volume de água em regime permanente para a Billings, respeitando todos os preceitos legais e, com isso, conseguiríamos gerar mais energia que seria vendida e pagaria o tratamento da água”, disse Antônio Bolognesi, diretor de Geração da Empresa Metropolitana de Águas e Energia (EMAE).

Atualmente, o processo de flotação está parado por determinação judicial impetrada pelo Ministério Público, no qual foi exigido um Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA). Outro fator que justifica a inércia relacionada ao projeto é o debate entre o Ministério Público e investidores (Petrobrás e EMAE), sobre a verba para a conclusão do processo de flotação em fase experimental. “Há uma questão polêmica sobre a represa Billings. São técnicos que se dizem especialistas em qualidade de água, que por ciúmes ou vaidade, ficam criticando o projeto, sem contar interesses econômicos e políticos”, ressaltou Bolognesi. O presidente do PROAM divergiu. “É uma ação que a médio e longo prazo sacrifica a Billings como reservatório de abastecimento”, concluiu Bocuhy.

Enquanto governo, investidores e ambientalistas continuam a debater e contrapor seus pontos de vista, a represa Billings padece e comemora seus 81 anos de existência da pior maneira possível.
  • A agricultura é responsável por 70% do consumo de água mundial, porém com uma eficiência de 30% a 40%;
  • 92% da água disponível são consumidos pela atividade econômica e 8% para abastecimento;
  • 3% é o porcentual de água apropriada para o consumo humano, entretanto, 0,063% estão na superfície;
  • 5 milhões de pessoas morrem anualmente por consumirem água poluída e 1,2 bilhão de pessoas não têm acesso permanente à água potável.
Fonte da Pesquisa: ONU (Organizações das Nações Unidas)

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